sábado, 17 de março de 2012

Xokleng: nome, língua e Localização



Os índios Xokleng da TI Ibirama em Santa Catarina, são os sobreviventes de um processo brutal de colonização do sul do Brasil iniciado em meados do século passado, que quase os exterminou em sua totalidade. Apesar do extermínio de alguns subgrupos Xokleng no Estado, e do confinamento dos sobreviventes em área determinada, em 1914, o que garantiu a "paz" para os colonos e a conseqüente expansão e progresso do vale do rio Itajaí, os Xokleng continuaram lutando para sobreviver a esta invasão, mesmo após a extinção quase total dos recursos naturais de sua terra, agravada pela construção da Barragem Norte.

Nome

A história do nome dos Xokleng tem provocado muitos debates. Desde seus primeiros contatos amistosos com os funcionários do Serviço de Proteção aos Índios (SPI), a partir de 1914, as denominações dadas ao grupo foram as mais variadas: "Bugres", "Botocudos", "Aweikoma", "Xokleng", "Xokrén", "Kaingang de Santa Catarina" e "Aweikoma-Kaingang".

Estas denominações se devem à proximidade lingüístico-cultural existente entre os Xokleng e os Kaingang; à pouca importância dada pelos etnógrafos à auto-denominação; e ao desconhecimento da etno-história dos Xokleng.


Na primeira etnografia sobre os Xokleng, Jules Henry (1941), apesar de denominá-los Kaingang, admitiu haver diferenças lingüístico-culturais entre eles e os outros Kaingang. Gregory Urban (1978) afirma que os Xokleng se originaram dos Kaingang, e tal separação se deu devido à fissões de suas patri-metades, e que o termo "Xokleng" é muito genérico e não lhes dá identidade. Os índios alegam que esta palavra, que significa "aranha" ou "taipa", foi "inventada pelos brancos por engano". Por outro lado, os próprios Kaingang não reconhecem os Xokleng como "parentes".

Entretanto, o termo "Xokleng", popularizado pelo trabalho do etnólogo Sílvio Coelho dos Santos, foi incorporado pelo grupo enquanto denominador de uma identidade externa, usada em suas lutas políticas junto à FUNAI e aos meios de comunicação. Hoje, muitos se auto-denominam "Laklanõ", isso é , "gente do sol" ou "gente ligeira". O termo Laklanõ vem ganhando espaço político interno através de um movimento recente de recuperação de seu idioma, escrita de mitos antigos e bilingüismo.

Língua

As línguas dos Xokleng e dos Kaingang constituem o ramo meridional da família Jê.

De acordo com os índios, na TI Ibirama (SC), fala-se o "xokleng", um idioma próximo ao kaingang. Os Xokleng dizem entender alguma coisa de kaingang, mas não o falam. Nos últimos vinte anos, o número de falantes de xokleng se reduziu bastante. A grande maioria dos jovens fala somente português. Isso se deve ao aumento de casamentos com não indígenas; às inúmeras rupturas sociais, políticas, econômicas e culturais provocadas pela construção da Barragem Norte; e à presença de escolas para indígenas com a mesma grade curricular das demais escolas públicas, que não estimulam e nem consideram as particularidades culturais.

De 1992 para cá, por iniciativa do Xokleng Nanblá Gakran, a aprendizagem do idioma vêm sendo incorporada nas escolas da TI Ibirama. Um pequeno dicionário xokleng-português e um livreto com "lendas", nos dois idiomas, foram produzidos por ele, com o apoio da FUNAI, prefeituras locais e pela FURB (Fundação Universidade Regional de Blumenau) e estão sendo usados em sala de aula. Através desta iniciativa, tanto os adultos, que não conheciam o xokleng escrito, quanto as crianças, que não falavam a língua, estão despertando para a importância de se conhecer seu idioma e cultura. Hoje, o idioma, que os Xokleng já gostam de falar em público, tem se tornado um símbolo político muito forte ligado à idéia de fonte de poder e da construção de uma identidade étnica positiva.


Localização

A TI Ibirama está situada ao longo dos rios Hercílio (antigo Itajaí do Norte) e Plate, que moldam um dos vales formadores da bacia do rio Itajaí-açu, e está a cerca de 260 km a noroeste de Florianópolis e 100 a oeste de Blumenau. Localizada em quatro municípios catarinenses, cerca de 70% da área está dentro dos limites dos municípios José Boiteux e Doutor Pedrinho. Essa TI inicialmente denominada Posto Indígena Duque de Caxias, foi criada pelo chefe do governo catarinense, Adolfo Konder, em 1926, que destinou aos Xokleng uma área de 20.000 hectares. Em 1965 foi oficialmente demarcada e em 1975 recebeu o nome de Ibirama.

Essa TI ocupa área de floresta subtropical, que até os anos 60 era riquíssima em palmito, mas a extração predatória praticamente o extinguiu. No início dos anos 70 a floresta nativa, onde abundavam madeiras nobres, começou a ser explorada por madeireiras, com o aval da Funai, para um alegado usufruto pelos índios. Toda a reserva de madeira praticamente se extinguiu em meados dos anos 80.

A partir dos anos 70, a TI Ibirama sofreu outra grande transformação com a construção da Barragem Norte, que represou o rio Hercílio junto à sua divisa sudeste, com o objetivo de conter as enchentes nas cidades industriais do baixo vale do Itajaí, como Blumenau. O lago de contenção formado inundou cerca de 900 hectares das terras mais planas e agricultáveis da TI. Com a inundação, os Xokleng tiveram de se mudar para as partes altas da TI, onde a mata era virgem e de onde não sabiam tirar o sustento. Intensificou-se a partir daí a exploração da madeira. A TI foi loteada entre famílias nucleares em "frentes" de exploração delimitadas. A comercialização da madeira privilegiou os comerciantes locais e vários funcionários da Funai, além dos Kaingang e mestiços Kaingang-brancos. Somente em 1997 a Funai organizou uma equipe interdisciplinar para recuperar as áreas invadidas por madeireiras e estudar a possibilidade da redefinição dos limites da TI. A tensão no local ainda é grande e exige a presença de autoridades para intermediar os conflitos entre madeireiros, índios e colonos.

Ainda hoje o processo de indenização aos Xokleng, pela inundação de parte da TI não avançou; também não houve a construção total de casas, pontes e estradas prometidas pelo governo. Na TI Ibirama já não se pratica a agricultura e a caça é rara. A pesca serve como suplemento alimentar, junto a alimentos comprados.

Demografia

A população da TI Ibirama é flutuante, multiétnica, e sua configuração vem se alterando ao longo dos 84 anos de contato. O último censo feito em 1997, além do total de 1.009 pessoas vivendo na TI, contou cerca de 20 famílias Xokleng morando nas periferias das cidades de Blumenau, Joinville e Itajaí.

Os critérios de inclusão e exclusão étnicos usados nestes censos e estimativas não foram definidos. Porém, é possível afirmar com segurança que a população da TI Ibirama não é composta por uma única etnia e que os casamentos inter-étnicos são freqüentes. A identidade étnica alterna-se conforme fatores conjunturais; assim, como apenas os Xokleng se vêm no direito às indenizações a serem pagas pela inundação provocada pela barragem, verificamos um alto número de "Xokleng" e Mestiços e um baixo número de "Kaingang" no último censo. Mas, internamente, os Kaingang, Mestiços, Cafuzos e Guarani são bem diferenciados dos chamados "Xokleng puros".

A presença de Kaingang e seus descendentes na TI Ibirama deve-se ao fato do SPI ter usado duas famílias Kaingang, provenientes do Paraná, para ajudar na atração e "pacificação" dos Xokleng, dando aos Kaingang o direito ao usufruto da terra. Desde então casamentos interétnicos vêm ocorrendo, e o número de mestiços Kaingang/ Xokleng tornou-se marcante. Porém, boa parte dos Kaingang e Mestiços se casou com não-índios, principalmente com funcionários do SPI e com colonos italianos; com a construção da barragem, algumas mulheres Xokleng se casaram, ou tiveram filhos, com os operários; e quando se deu início à exploração de madeira muitos não-índios se casaram com Xokleng e Kaingang para usufruir do direito de explorar e vender a madeira. Mais recentemente, vários Xokleng se casaram com mulheres Kaingang de outras terras indígenas do Paraná e Santa Catarina.

Os Cafuzos que viviam na TI Ibirama são na verdade negros remanescentes da Guerra do Contestado, sem terra, trazidos por iniciativa do então chefe do Posto Indígena, Eduardo de Silva Lima Hoerhann, a partir da segunda metade da década de 40, e usados como mão-de-obra agrícola quase escrava. Em 1991, quase todos saíram para uma terra próxima cedida pelo INCRA. Os casamentos entre Xokleng e Cafuzos foram raros.

As primeiras famílias Guarani chegaram à TI Ibirama vindas do sudoeste e das fronteiras com o Paraguai e Argentina, nos anos 50. Eles vivem social, cultural e geograficamente isolados dos outros grupos; não tiveram direito à extração da madeira e nem às indenizações pela inundação. Em 1991 metade dos Guarani migrou para o litoral. Os casamentos entre Guaranis e Xokleng foram raros.

Os censos mostram também a morte em massa dos primeiros Xokleng contatados, vítimas de grandes epidemias de gripe, febre amarela e sarampo (entre 1914, o ano do contato, e 1935 morreram dois terços dos Xokleng).


Crédito da imagem http://www.revistapersona.com.ar/Persona65/65Flammariom.htm

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