terça-feira, 14 de fevereiro de 2012

NAMBIKWARA I

Introdução, nome, língua e localização

Famosos na história da etnologia brasileira por terem sido contatados “oficialmente” pelo Marechal Rondon e por terem sido estudados pelo renomado antropólogo Claude Lévi-Strauss, os Nambiquara vivem hoje em pequenas aldeias, nas altas cabeceiras dos rios Juruena, Guaporé e (antigamente) do Madeira.

Habitam tanto o cerrado, quanto a floresta amazônica e as áreas de transição entre estes dois ecossistemas. Os Nambiquara ocuparam uma extensa região no passado e se caracterizaram pela mobilidade espacial. Dotados de uma cultura material aparentemente simples e de uma cosmologia e um universo cultural extremamente complexos, os Nambiquara têm preservado sua identidade através de um misto de altivez e abertura ao mundo.

O termo Nambiquara é de origem Tupi e pode ser glosado como “orelha furada”. Foi a partir da penetração da Comissão Rondon no interior do Mato Grosso que os índios até então referidos como “Cabixi” passaram a ser designados “Nambiquara”, termo pelo qual são conhecidos até hoje.

Os guias Pareci que trabalharam para a Comissão Rondon, pensavam que este termo tupi - usado originalmente para designar um grupo falante de língua Jê localizado na região entre o rio Arinos e o rio Sangue - significava “inimigo” e, assim, usaram-no, quando falavam em português com os funcionários da Comissão, para se referir aos seus vizinhos ocidentais.

Outras grafias
O etnônimo ainda pode ser grafado de outras formas: Nambikwara, Nambicuara e Nhambicuara.Assim, desde o início do século XX, este termo é usado para designar os diversos grupos que ocupavam a região que compreende o noroeste do estado do Mato Grosso e as adjacências do estado de Rondônia, entre os afluentes dos rios Juruena e Guaporé até as cabeceiras dos rios Ji-Paraná e Roosevelt.


Outros nomes
Se o nome “Nambiquara” é uma designação genérica dos povos que habitam a Chapada dos Parecis, o Vale do Guaporé e a região mais ao norte, há por outro lado uma profusão de nomes utilizados pelos índios para designar os subgrupos Nambiquara.
Entre os Nambiquara do norte, existem os Da’wandê, os Da’wendê, os Âlapmintê, os Yâlãkuntê (Latundê), os Yalakalorê, os Mamaindê e os Negarotê. Entre os Nambiquara do sul, estão os Halotésu, os Kithaulhu, os Sawentésu, os Wakalitesu e os Alakatesu. E entre os Nambiquara do vale do Guaporé, encontramos os Wasusu, os Sararé, os Alãntesu, os Waikisu e os Hahãitesu.

Língua

Os grupos que ocupavam e que ainda ocupam a Chapada dos Parecis, o Vale do Guaporé e a região norte, entre o rio Iquê e os rios Cabixi e Piolho, falam línguas da família lingüística Nambiquara. Trata-se de uma família lingüística sem qualquer relação comprovada com outras famílias lingüísticas da América do Sul.

De acordo com a classificação de David Price (1972), a família lingüística Nambiquara pode ser dividida em três grandes grupos de línguas faladas em diferentes regiões do território Nambiquara. São elas: Sabanê, Nambiquara do norte e Nambiquara do sul.

"Com exceção da língua Sabanê, que conta hoje com menos de 20 falantes, as outras línguas Nambiquara encontram-se bem preservadas. O português é falado por todos Nambiquara do sul e pela grande maioria dos Nambiquara do Norte. No Vale do Guaporé, o entendimento do português é mais acentuado entre os mais jovens. De forma geral, as mulheres também têm menor grau de conhecimento do português do que os homens, pois estes saem muito mais das aldeias. A única área que desenvolveu o multilingüismo entre os Nambiquara é o norte. Nos anos 90, ainda havia falantes do Sabanê e do Nambiquara do Norte capazes de falar as três línguas Nambiquara (e mais o português). O multilingüismo neste caso é resultado da intensificação do contato entre estes grupos". (Marcelo Fiorini).

Sabanê
A língua Sabanê, falada por grupos que habitavam o extremo norte do território Nambiquara, provavelmente ao norte do rio Iquê, na região entre os rios Tenente Marques e Juruena, apresenta grandes diferenças em relação às outras duas línguas.

Em um estudo comparativo, Price (1985) concluiu, a partir do alto número de cognatos [palavras similares] observados entre o Sabanê e as outras duas línguas Nambiquara, que, apesar das diferenças, a língua Sabanê pertence à família lingüística Nambiquara. Os grupos falantes de Sabanê foram severamente afetados pelas epidemias decorrentes do contato e muitos deles foram extintos.

Atualmente, a maioria dos remanescentes desses grupos encontra-se na Terra Indígena Pyreneus de Souza e é genericamente classificada como Sabanê. Alguns deles vivem com os Mamaindê e algumas famílias migraram para a cidade de Vilhena, em Rondônia.

Nambiquara do norte
Os grupos falantes da língua Nambiquara do norte habitavam os vales do rio Roosevelt e do rio Tenente Marques e também a região mais a noroeste, que inclui a área banhada pelos rios Cabixi e Piolho. Eles são designados: Da’wandê, Da’wendê, Âlapmintê, Yâlãkuntê (Latundê), Yalakalorê, Mamaindê e Negarotê.

Price (1972) afirma que todos os dialetos desta língua são mutuamente compreensíveis, apesar das pequenas variações observadas entre os dialetos falados na região dos rios Tenente Marques e Roosevelt e aqueles falados na região do rio Cabixi, habitada tradicionalmente pelos Mamaindê. Este autor sugeriu que o dialeto falado pelos Negarotê, grupo localizado nas margens do rio Piolho, seria um dialeto intermediário em relação aos outros dois. Estudos recentes feitos por lingüistas do SIL indicam que o dialeto falado pelos Negarotê é muito similar àquele falado pelos Mamaindê.

Nambiquara do sul
A língua classificada como Nambiquara do sul é falada no restante do território Nambiquara, que pode ser dividido de acordo com três áreas dialetais: o vale do Juruena, a região formada pelos rios Galera e Guaporé e o vale do Sararé.

Na região do vale do Juruena encontram-se os grupos que são referidos na bibliografia como “Nambiquara do cerrado” ou “Nambiquara do campo”. Eles se situam no nordeste da chapada dos Parecis e são designados: Halotésu, Kithaulhu, Sawentésu, Wakalitesu e Alakatesu.

Price (1972) distinguiu quatro dialetos falados pelos grupos que habitam toda a extensão da chapada. O primeiro é falado pelos grupos situados no extremo norte da chapada dos Parecis, na região conhecida como Serra do Norte. Esses grupos eram conhecidos como Niyahlósú, Si’waisu e Lunkatesu e, atualmente, são conhecidos como Manduca. O segundo dialeto é falado pelos grupos localizados na região banhada pelo rio Camararé, o terceiro pelos grupos que estão na região entre os rios Formiga e Juína e o quarto pelos grupos que estão situados na região entre os rios Juruena e Sapezal.

Apesar de falarem a mesma língua (Nambiquara do sul), os grupos localizados nessas quatro áreas dialetais têm dificuldades de entender uns aos outros, sendo que os grupos que se localizam no Vale do Guaporé parecem falar um dialeto intermediário entre os dialetos falados no vale do Juruena, ao leste, e no vale do Sararé, à sudoeste do território Nambiquara.

Os grupos que habitam toda a região do Vale do Guaporé, abaixo do rio Piolho, são conhecidos como: Wasusu, Sararé, Alãntesu, Waikisu, Hahãitesu e são chamados genericamente de ‘Wãnairisu, termo que faz referência a um tipo de corte de cabelo característico dos grupos desta região (Fiorini, 1997: 1).

Localização

O território tradicionalmente ocupado pelos Nambiquara pode ser dividido em três áreas geográficas.
A primeira é formada pela Chapada dos Parecis que corresponde à parte oriental do território Nambiquara. Esta região consiste em um planalto que é cortado pelo rio Juruena e seus afluentes: os rios Juína, Formiga, Camararé, Camararézinho, Nambiquara, Doze de Outubro e Iquê. A área é coberta por grandes extensões de savana. A floresta densa cobre apenas 5% da região. Os grupos que vivem neste local concebem todo o território ocupado pelos Nambiquara a partir da distinção entre áreas de savana (halósú) e áreas de floresta (sá’wentsú).

A região do Vale do Guaporé corresponde ao oeste do território Nambiquara, entre o limite do planalto acima mencionado e o rio Guaporé. Oitenta e cinco porcento da região é coberta por floresta. Na parte abaixo do planalto, a floresta é mais densa e o solo mais fértil. A floresta diminui à oeste, na direção do rio Guaporé, área que é composta por várzeas e planícies inundáveis. Em direção ao rio Guaporé, correm os rios Cabixi, Piolho, Galera e Sararé. Este último define o limite sul do território ocupado pelos Nambiquara. A região do rio Sararé é separada do restante do Vale do Guaporé pela Chapada de São Francisco Xavier. O rio Guaporé desemboca no rio Madeira, a noroeste.

No norte da área Nambiquara, as florestas cobrem a região ao longo dos rios Roosevelt e Ji-Paraná, assim como seus afluentes. Em todas as três regiões descritas, o clima é caracterizado por um período chuvoso entre setembro e março e um período seco
no restante do ano.

Os Nambiquara costumam se estabelecer nas regiões próximas às cabeceiras dos rios e, conforme observou Price (1972), os próprios limites do território Nambiquara tendem a estar relacionados aos limites de navegabilidade dos rios que o cortam. Este autor sugere, portanto, que a extensa área ocupada por esses grupos pode ter sido definida pelos obstáculos naturais que impediram a aproximação de índios ribeirinhos que usavam canoas, como os grupos Tupi.

Foto http://newswatch.nationalgeographic.com/2011/04/01/uncontacted-tribes-the-last-free-people-on-earth/
Fonte http://pib.socioambiental.org/pt/povo/nambikwara

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