As primeiras notícias sobre os Asurini datam de fins do século XIX. Em 1894, o ataque a um regional, no local chamado Praia Grande, acima da boca do Rio Bacajá, foi atribuído aos índios Asurini (Nimuendajú,1963c:225). Em 1896, os Asurini atacaram na Serra do Passahy e na Praia Grande, de acordo com o cronista estrangeiro Coudreau (1977:37). Nas margens do Rio Bacajá ainda se verificaram investidas dos Asurini no final do século XIX (Nimuendajú,1963c:225). Nesse período, esses índios também foram atacados diversas vezes por brancos (provavelmente extratores de caucho), que atearam fogo às suas aldeias
(Mancin,1979b:2).
Das margens do Rio Bacajá, deslocaram-se em direção às cabeceiras dos rios Ipiaçava e Piranhaquara, onde estabeleceram várias aldeias. Em 1932 há notícia de um ataque de índios asurini na foz do Igarapé Bom Jardim. Em 1936, foram atacados pelos índios Gorotire, subgrupo Kayapó, durante sua expansão em direção ao norte (Nimuendajú,1963c:225). Pressionado pelos Kayapó, os Asurini passaram a habitar as margens do Rio Ipixuna durante um longo período.
Entre 1965 e 1970, os Asurini foram desalojados dessa área pelos índios por eles denominados Ararawa (Araweté). Há notícia de que os Xikrin do Bacajá atacaram os Asurini em 1966 (Cotrim, 1971b e Lukesch,1971:13) na região do Rio Branco, afluente do Bacajá. Na década de 1960, a caça ao gato selvagem e a extração da seringa levaram os regionais a adentrarem os afluentes da margem direita do Rio Xingu, provocando encontros hostis com a população indígena. Reocupando a região do Rio Ipiaçava e Piranhaquara, os Asurini continuaram mantendo relações de hostilidade com os brancos, todavia, em encontros rápidos e fugidios.
Os Asurini realizavam saques nos acampamentos dos brancos para obterem artigos de metal (facões, machados etc.). Na década de 1970, intensificou-se a presença dos brancos com a finalidade de contatar os grupos indígenas da região e decorrente do surgimento de novas atividades econômicas: mineração, agropecuária e projetos do governo (em especial a construção da Rodovia Transamazônica).
Entre as alterações, Cotrim enfatiza a perspectiva de extensão da província ferrífera da Serra dos Carajás até a margem direita do Rio Xingu, trazendo "ao cenário de disputas do território tribal novos protagonistas: a Meridional Consórcio United States Steel-CVRD" (Soares,1971b: 4). Segundo o sertanista, através de sobrevôos aéreos foram localizados diversos aldeamentos e estabelecido um programa de "pacificação" financiado pela referida empresa, ficando a responsabilidade da missão sob encargo dos missionários católicos Anton e Karl Lukesch.
Para o Monsenhor Anton Lukesch, "contatar uma das poucas sociedades realmente isoladas e não aculturadas que ainda sobrevivem no mundo moderno e estudar, entender e tornar conhecido seu estilo de vida aborígine" representam o sonho mais profundo de todo etnólogo. Além disso, Lukesch justifica sua expedição como uma "participação" que se tornara urgente para "evitar confrontações interétnicas dramáticas e trágicas" com o advento da Transamazônica (1976:9). Entretanto, Antonio Cotrim Soares alega:
"Em parte, o respeito aos domínios territoriais dos Asurini prende-se mais à ausência de disputas de interesses econômicos do que propriamente ao receio de embates violentos, quando são bastante conhecidas as estórias xinguanas das promoções de excursões armadas, financiadas pelos potentados regionais contra grupos indígenas, que impediam a expansão das atividades extrativistas dos seringais. Como se vê, foi a inexistência de seringais nativos que preservou a autonomia territorial dos Asurini" (1971b:13).
Na década de 1970, acossados por grupos inimigos por um lado, e "pacificados" pelos interesses de uma empresa multinacional por outro, os Asurini não tiveram outra opção a não ser aceitar o contato. Conta o padre Lukesch (1976:18) que um índio fazia gestos pedindo que fosse embora, no momento do primeiro encontro, mas outro Asurini assumiu a dianteira e tentou estabelecer relações diretas e amistosas com os brancos.
Nessa época, ocorriam brigas intertribais e, de acordo com Takamui, um asurini de mais de 50 anos, seu povo teve que fugir dos Araweté, se deslocando em direção ao Piranhaquara e Ipiaçava com o objetivo de buscar aliança com os brancos ali existentes. Não só os irmãos Lukesch estavam em seu encalço, como também a Funai mantinha frentes de atração nessa área. Soares relata as atividades da frente que chefiava no decorrer da segunda penetração na área do Igarapé Ipixuna (janeiro/fevereiro de 1971), como a visita a uma das aldeias habitadas e a documentação coletada através de fotografias e gravações. Um detalhe em seu relatório, "A existência de uma maloca comunal abandonada" (1971a:3) - evidencia o que estava ocorrendo entre esses grupos. A existência de objetos de madeira e de cerâmica decorada com desenhos geométricos e da casa comunal atesta que se tratava de uma aldeia asurini, ocupada pelos Araweté e cujos habitantes teriam fugido após o ataque deste grupo.
Em abril de 1971, a expedição dos Lukesch, melhor patrocinada que as pobres frentes de atração da Funai, contatou os índios do Ipiaçava, fazendo com que Cotrim Soares alterasse o roteiro da sua expedição e assumisse os trabalhos dos padres, uma vez que as atividades destes foram proibidas pelo órgão indigenista (Soares,1971b:5).
Cotrim interpretou a aproximação pacifica dos Asurini com os brancos como uma solução para sua situação desesperada:
"entre estes (os brancos) teriam um refúgio seguro contra as hostilidades dos seus antagonistas - ou mesmo aliados para uma futura vindeta". Os Asurini não tiveram melhor sorte com a frente da Funai do que com os missionários austríacos, os irmãos Lukesch. Segundo Cotrim, as atividades dos padres foram proibidas pela Funai "devido aos sérios prejuízos que involuntariamente causaram à comunidade" (1971b:5).
Devido à não adoção de medidas preventivas pela expedição de Lukesch, houve "contaminação do grupo" com uma violenta epidemia de gripe e malária, resultando em 13 mortes e longo período de convalescença, que atingiu todo o grupo.
Cotrim, entretanto, não deixa de reconhecer que também houve um relaxamento da parte da Funai. Por exemplo, deixou-se de vacinar os componentes das frentes de penetração. Nas palavras do sertanista, "Um outro acontecimento que não passa desapercebido foi o retardamento da nossa ação em debelar o surto epidêmico, pois não dispúnhamos de recursos imediatos, visto os entraves burocráticos na liberação destes" (1971b:6).
As dificuldades para prosseguir o trabalho junto aos Asurini e o desencanto de Antonio Cotrim Soares com a "causa indígena" ficaram conhecidos na época com seu desabafo à imprensa, quando recusou-se a continuar sendo "coveiro de índios" e denunciou as condições de trabalho na Funai:
"com o evento do contato, as primeiras conseqüências já são manifestas: ...Moléstias contagiosas, depopulação, crise alimentar e prenúncio de sua dependência à sociedade nacional. Uma gama de fatores que contribuíram para essas conseqüências, tendo como principal pivô a falta de racionalização no método desenvolvido nesta fase de contato - denominada pelos promotores de catequização. Os efeitos negativos advieram pela ausência de medidas profiláticas, distribuição inconseqüente de brindes, falta de seleção e controle do grupo de trabalho nas suas relações com os índios - parece-nos que este método de atuação nos contatos com grupos arredios tornou-se uma peculiaridade, sem o exclusivismo dos promotores. No primeiro plano, os resultados mais funestos foram de natureza biótica, além de elevada taxa de mortalidade, debilitou-os organicamente por um longo período. Os mais atingidos pelo 'fatalismo' foram os velhos. As vicissitudes dos efeitos depopulativos começaram a atingir sua organização social; as lideranças de grupos domésticos ficaram acéfalas, desorganizando inicialmente sua força produtiva. Toda a vida social foi afetada, principalmente suas atividades econômicas que ficaram estagnadas por falta de força de trabalho. Perdurou por mais de dois meses o estado geral de debilitação. Decorrente deste estado, perderam a estação de preparo do solo, sendo apenas aproveitado um baixo percentual do trabalho iniciado".
Em outro momento:
"O seu cotidiano é de penúrias, já que surgem as primeiras manifestações de desencantamento, apesar de proverem-se de alimentos fornecidos pelos brancos. Atualmente, a base da sua dieta alimentar é farinha fornecida pela Funai, complementada com reduzida cota de batata-doce, mandioca e outros alimentos colhidos em suas roças".
E ainda:
"A quota de alimentos fornecida pela Funai é insignificante em relação ao mínimo calórico recomendado pela tabela dietética, a quota média do fornecimento diário de farinha é de 12Kg para 40 índios - representando cerca de 300g homem/dia. Adicionando-se a esses fatores, temos os traumas psicológicos: os contrastes tecnológicos, hábitos sofisticados, intervenção em seu comportamento médico - religioso (adoção de técnicas medicinais com produtos químicos farmacêuticos) entre os efeitos imediatos, talvez, já postos em confrontações, nesta fase do contato" (1971b: 23-24).
Demitido da Funai, Cotrim abandonou sua carreira de sertanista e os Asurini continuariam a sofrer os prejuízos do contato. Contam os índios que, depois de Cotrim, permaneceu outro membro da Frente esquecido entre eles e que chegou a ficar "sem açúcar". Os próprios índios resolveram ir sozinhos a Altamira buscar recursos, enganando o responsável pelo Posto, quando lhe disseram que saíam para uma excursão de caça. O episódio é contado hoje com humor, mas revela o abandono a que foram relegados, uma vez "pacificados".
Na década de 1980, por recomendação da antropóloga Berta Ribeiro - que estivera entre os Asurini em 1981 -, o Secretariado Nacional do Cimi (Conselho Indigenista Missionário) conseguiu autorização do então presidente da Funai, Cel. Paulo Leal, para que duas missionárias do grupo Irmãzinhas de Jesus viessem se estabelecer entre os Asurini do Xingu. Elas desembarcaram na aldeia em meados de 1982, trazendo na bagagem uma longa e bem-sucedida experiência de apoio à recuperação dos Tapirapé, também um povo Tupi, que vive nas proximidades do Rio Araguaia (MT) e que passou por um processo semelhante de depopulação após o contato. As missionárias não quiseram assumir formalmente nenhuma atividade de assistência, em substituição às obrigações da Funai. Na época, não se formalizou entre elas e a Funai nenhum tipo de convênio, ficando explícito que se tratava de "uma ação paralela, de orientação e conhecimento dos problemas do grupo em seu processo de recuperação".
http://pib.socioambiental.org/pt/povo/asurini-do-xingu/1278
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