Assembleia realizada na aldeia Crispim, na terra indígema Paumari, na bacia do Purus |
"Álbum Purus" apresenta um aprofundado estudo sobre os agente sociais (índios, extrativistas, seringueiros, ribeirinhos) presentes na região
Muito se comenta, mas pouco se estuda sobre a bacia do rio Purus, no sul do País. O vale do Purus é emblemático no seu aspecto histórico, sobretudo na sua contribuição para a economia extrativista e a exploração da borracha e na pouco mencionada participação dos povos indígenas nessa dinâmica social.
Para preencher um vazio bibliográfico na historiografia e na etnografia regional que ultrapasse as reflexões meramente positivas e naturalistas, um grupo de professores da Universidade Federal do Amazonas e de outros instituições do país, além de membros que atuam como especialistas em organizações não-governamentais, empreendeu uma jornada nas fontes documentais diversas (que incluem inclusive notas comerciais, microfilmes, fotografias, relatos de órgãos indigenistas) sobre o Purus, que abrange desde o final do século 19 até os nossos dias.
A coletânea “Álbum Purus”, publicada pela Editora da Ufam (Edua), propõe fazer uma revisão bibliográfica e um estudo atualizado e ressignificado da atuação dos povos nativos e dos seringueiros na dinâmica extrativista que ainda resistia naquela região, não obstante o colapso da economia da borracha.
A coletânea, escrita por 15 autores e organizada pelo professor do Programa de Pós-Graduação em Antropologia Cultural (PPGAS), Gilton Mendes dos Santos, será lançada na próxima sexta-feira (1º). O lançamento acontece na sede do PPGAS, na rua Ferreira Pena, S/N, Centro.
Indígenas
Quando Euclides da Cunha (1866-1909) se aventurou pela Amazônia no início do século 20, empreendendo uma jornada desastrosa que culminou em um estudo quase antipático sobre a região, poucas páginas foram dedicadas aos indígenas.
Euclides da Cunha tinha a missão de mapear as cabeceiras do rio Purus. Inspirado no pensamento positivista, o escritor defendia o progresso do país pela ocupação do “homem amazônico” e nesse empreendimento não havia espaço para a presença indígena, com exceção de sua integração. Pensamento, aliás, cuja herança ainda permanece em muitos ideais de autores que estudam a Amazônia.
Nesta época, a bacia do Purus se transformara na última opção de exploração e comercialização da borracha, em uma época de colapso da economia regional gumífera. Os barracões, o sistema de aviamento, o recrutamento de nordestinos continuaram em franco crescimento.
Os textos do “Álbum Purus” procura dar a devida relevância dos povos indígenas na dinâmica extrativista da borracha, além de mostrar, por meio de documentos, que a maioria deles foram recrutados, com anuência do então Serviço de Proteção ao Índio (SPI), sob a justificativa de que, fora de seus territórios, estariam mais seguros.
Territórios foram tomados, alguns grupos considerados “hostis” foram caçados e exterminados. Os indígenas foram tão vítimas (ou mais) do que os nordestinos que vieram para um “ambiente hostil que os levava até mesmo a cometer atrocidades” , para citar uma análise de Euclides da Cunha.
Painel
Os autores Renan Freitas Pinto, Davi Avelino Leao e Gilton Mendes Santos fazem um resgate das anotações Euclides da Cunha. Almir Diniz de Carvalho Júnior remonta o papel da empresa JG Araújo, empresa que resistiu às crises com sua impressionante presença no comércio de vários produtos da região do Purus até Manaus.
A coletânea traz ainda estudos sobre o papel do SPI e os postos indígenas que atraiam indígenas para atividades extrativistas e de agricultura, um relevante trabalho que cobre a lacuna sobre a presença das populações nativas na região.
A coletânea também traça um painel contemporâneo sobre as presença e as relações entre os principais agentes sociais que vivem na região, especialmente indígenas, ribeirinhos e extrativistas.
O autor Miguel Aparício chega a apontar uma “reconfiguração territorial da região, há uma tendência ao aumento da disputa pelos recursos naturais entre índios e extrativistas”.
“O atual Purus passa a ser o ricochete das tantas projeções feitas no passado por Euclides da Cunha (...). Aí não se instalou o grande projeto civilizador, e aqueles que soçobrariam a este – seus povos nativos – ocultos e silenciados pela pena do erudito escritor, agora roubam a cena, nos brindando com um modelo de vida e modos de conceber a Amazônia tão necessária nos tempos atuais”, escreve Gilton Mendes dos Santos, na Introdução do livro.
Elaíze Farias
http://acritica.uol.com.br/amazonia/Amazonia-Amazonas-Manaus-Coletanea-Ufam-historico-extrativista-Purus_0_506958889.html
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