sábado, 12 de novembro de 2011

BOTOCUDOS KRENAK


Os Krenak são os últimos Botocudos do Leste, vítimas de constantes massacres decretados como "guerras justas" pelo governo colonial. Hoje, vivem numa área reduzida reconquistada com grandes dificuldades.

Os Krenák ou Borun constituem-se nos últimos Botocudos do Leste, nome atribuído pelos portugueses no final do século XVIII aos grupos que usavam botoques auriculares e labiais. São conhecidos também por Aimorés, nominação dada pelos Tupí, e por Grén ou Krén, sua auto-denominação.
O nome Krenák é o do líder do grupo que comandou a cisão dos Gutkrák do rio Pancas, no Espírito Santo, no início do século XX. Localizaram-se, naquele momento, na margem esquerda do rio Doce, em Minas Gerais, entre as cidades de Resplendor e Conselheiro Pena, onde estão até hoje, numa reserva de quatro mil hectares criada pelo SPI, que ali concentrou, no fim da década de 20, outros grupos Botocudos do rio Doce: os Pojixá, Nakre-ehé, Miñajirum, Jiporók e Gutkrák, sendo este o grupo do qual os Krenák haviam se separado.

Os Krenák pertencem ao grupo lingüístico Macro-Jê, falando uma língua denominada Borun. Apenas as mulheres com mais de quarenta anos são bilíngües, enquanto os homens, jovens e crianças de ambos os sexos são falantes do português. Nos últimos três anos vêm envidando esforços para que as crianças voltem a falar o Borun.

Religião

Eram, à época do contacto, em 1910, predominantemente caçadores e coletores seminômades, com organização social caracterizada pelo constante fracionamento do grupo, pela divisão do trabalho por sexo e idade e um sistema religioso centrado na figura dos Marét e dos espíritos encantados de seus mortos, os Nanitiong, responsáveis pela fecundação das mulheres humanas e por emitir avisos de morte. Os Marét, habitantes das esferas superiores, eram os grandes ordenadores dos fenômenos da natureza e, dentre eles, se destacava o Marét-khamaknian, herói criador dos homens e do mundo, benevolente e civilizador da humanidade.

Outras entidades do panteão religioso dos Botocudos eram os espíritos da natureza - os tokón -, responsáveis pela eleição dos seus intermediários na terra, os xamãs, com os quais mantinham contacto durante os rituais e que, quase sempre, acumulavam o cargo de líderes políticos. Havia, ainda, as almas, espíritos que viviam nos corpos dos humanos, adquiridos a partir dos quatro anos de idade, quando eram implantados os primeiros botoques labiais e auriculares. A alma principal abandonava o corpo durante o sono e, quando se perdia, ocorria a doença. Antes de a pessoa morrer, sua alma principal morria dentro de seu corpo. As outras seis almas que habitavam o corpo acompanhavam o cadáver até seu túmulo, sobre o qual voavam, chorando. Eram invisíveis para os membros da comunidade presentes à cerimônia. Caso suas necessidades de alimento e luz não fossem atendidas, essas almas complementares poderiam transformar-se em onças e ameaçar a aldeia, pois, não se alimentando, morreriam de fome. Passados alguns anos, espíritos bondosos da esfera superior vinham buscá-las para seu espaço, de onde não mais voltavam. Dos ossos dos cadáveres, surgiam espíritos que passavam a morar no mundo subterrâneo, no qual o sol brilhava durante a noite terrestre. Eram espíritos grandes, maus e negros que vagavam pela aldeia atacando os vivos, principalmente as mulheres, desenterravam os mortos, batiam no chão, assustando a todos, matando animais por espancamento. As vítimas se defendiam tentando surrá-los e evitando saírem de seus abrigos durante a noite.

Histórico do contato

O território original dos Botocudos era a Mata Atlântica no Baixo Recôncavo Baiano, tendo sido expulsos do litoral pelos Tupi, quando passaram a ocupar a faixa de floresta paralela, conhecida por Floresta Latifoliada Tropical Úmida da Encosta ou Mata Pluvial Tropical, localizada entre a Mata Atlântica e o rebordo do Planalto. Depois do século XIX deslocaram-se para o sul, atingindo o rio Doce em Minas Gerais e Espírito Santo.

Desde os primeiros contactos, ainda no século XVI, foram acusados de antropofagia, o que não se confirma na documentação. Entretanto, este sempre foi o grande argumento para justificar as constantes decretações de Guerra Justa e convencer os grupos indígenas com que viviam em conflito - Tupi, Malalí, Makoní, Pataxó, Maxakalí, Pañâme, Kopoxó e Kamakã-Mongoió - a se aldearem com promessas de proteção e acesso aos bens da sociedade dominante, como armas de fogo. Apesar da resistência tenaz, os grupos Botocudos foram aldeados por militares, diretores leigos e missionários em vários pontos dos atuais estados da Bahia, Minas Gerais e Espírito Santo a partir da decretação da Guerra Justa autorizada pelo governo português através das Cartas Régias de 13 de maio, 24 de agosto e 2 de dezembro de 1808 assinadas no Rio de Janeiro pelo Príncipe Regente D. João.

A primeira Carta Régia determinava a guerra ofensiva aos Botocudos de Minas Gerais por considerar que os mesmos eram irredutíveis à civilização e que a guerra de caráter defensivo não surtia os efeitos desejados no tocante a garantir a expansão da conquista naquela capitania. A segunda autorizava o Governador e Capitão General da mesma capitania a criar uma tropa especializada no combate a índios para viabilizar a guerra ofensiva determinada na Carta Régia anterior. Finalmente, a terceira estabelecia planos acerca de como promover a educação religiosa dos índios e seu efetivo controle como forma de viabilizar a navegação dos rios e o cultivos dos terrenos ocupados pelos Botocudos. No contexto desse plano, o Príncipe autorizava o confisco das terras ocupadas por esses grupos, que passavam a ser consideradas como devolutas e deveriam ser distribuídas como sesmarias, particularmente entre os que se destacassem na guerra ofensiva. A esses novos proprietários também era garantido o livre acesso ao trabalho dos indígenas que fossem capturados em atitude aguerrida por um período que variava entre doze e vinte anos, a depender do grau de rusticidade e dificuldade dos aprisionados em apreenderem as novas formas de trabalho. Também era prevista a criação de aldeamentos administrados por particulares para educar os índios que se submetessem e se apresentassem "com interesse e boa disposição".

Embora as três Cartas Régias se referissem especificamente à capitania de Minas Gerais, as suas deliberações foram estendidas às capitanias da Bahia e Espírito Santo no mesmo ano para atender às solicitações de seus governadores. Hoje o contingente demográfico dos Botocudos do Leste está reduzido a cento e oitenta pessoas, sendo, na sua maioria, composto de crianças e jovens descendentes de relações interétnicas entre os Krenák com outros grupos indígenas, como os Guarani e os Kaingang, e com a população regional.

As principais razões dessa predominância de mestiços foram a invasão por moradores da região e o arrendamento pelo SPI das terras do Posto Indígena Krenák, o processo de diáspora sofrida ao longo da administração do SPI e da Funai - em 1953 para o Posto Indígena Maxakalí, de onde retornaram a pé em 1959, e em 1973 para a Fazenda Guarani -, e a convivência com os chamados "índios infratores" deslocados pela Funai de vários pontos do país, a partir de 1968, para o Reformatório Agrícola Indígena ou Centro de Reeducação Indígena Krenák.

http://pib.socioambiental.org/pt/povo/krenak
http://www.programadeindio.org/index.php?s=pi&n=programa&pid=131

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